terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Em busca de coerência

Por Bruno Costa* e Daniel Valença**

O PT é o maior patrimônio construído pela classe trabalhadora brasileira após a 2ª Guerra Mundial e após as ditaduras instaladas no Brasil. Surgiu numa conjuntura de refluxo das forças socialistas em nível internacional, pouco antes de Fukuyama “decretar” o fim da história. Ainda hoje, apesar dos pesares, o PT se mantém como antítese diante do imperialismo neoliberal, lidera um governo de ampla coalizão que referencia o Brasil no cenário internacional como território contra-hegemônico e divide a história nacional em dois momentos bem distintos.

Em tese, o Partido dos Trabalhadores continua impulsionando debates e agendas extremamente importantes para a radicalização da democracia brasileira, como a reforma tributária com taxação de grandes fortunas, reforma agrária, reforma política e democratização da comunicação. Na prática, após 10 anos de governos liderados pelo PT, as reformas estruturais permanecem travadas, reféns de um parlamento no qual a direita ainda possui hegemonia e de uma tese hegemônica no interior do próprio PT, segundo a qual a aliança com setores da burguesia é necessária para a continuidade da agenda desenvolvimentista e socialmente referenciada, pois o contrário seria permitir o retorno ao passado neoliberal.

Sendo assim, setores dos movimentos populares, trabalhadores e juventudes deixam de acreditar no PT enquanto instrumento classista, revolucionário e capaz de construir uma transição ao socialismo democrático no Brasil. O partido que estrelou as praças e avenidas brasileiras na luta pela redemocratização e contra o neoliberalismo tem se transformado numa máquina eleitoral, num partido da ordem, incapaz de representar a dor e a utopia de lutadores e lutadoras do povo.

Num lampejo de reflexão e autocrítica, a direção nacional do PT e a presidenta Dilma perceberam a necessidade de convocar a sociedade a debater uma ampla reforma política, capaz de reduzir a interferência do poder econômico no sistema político e eleitoral brasileiro, de fortalecer os partidos e seus programas, de ampliar compulsoriamente a participação das mulheres, bem como de efetivar instrumentos de democracia direta para dar vez e voz à maioria do povo brasileiro, que hoje é sub-representada no Congresso Nacional em virtude da mercantilização da política.

Mas como defender uma reforma política que caminha na contramão da democracia burguesa e importar um modelo semelhante de democracia para a disputa interna do Partido dos Trabalhadores? O poder econômico não interfere no Processo de Eleições Diretas do PT? O que prevalece é o debate político democrático entre as diversas correntes de opinião que constroem o PT ou o processo de filiação em massa e de transporte de eleitores no dia da votação que define as novas direções e diretrizes políticas do partido? Queremos um partido de milhares de militantes organizados nas instâncias de base e nos movimentos sociais ou queremos um partido de milhares de indivíduos - na melhor tradição liberal – filiados, exercendo apenas a escolha de seus representantes sem, frequentemente, conhecerem as plataformas políticas de cada chapa?

Não há mais como se orgulhar de um instrumento que teoricamente representa uma inovação no que diz respeito à democracia interna dos partidos de esquerda, que teoricamente empodera a militância partidária, quando na prática representa o esvaziamento do debate, a mercantilização da disputa e o enfraquecimento do PT enquanto instrumento vivo de disputa política e ideológica no interior da sociedade. É a democracia liberal representativa – aquela que esvaziou o conteúdo da palavra democracia – no PT. Contra ela lutamos no cenário político nacional e contra ela devemos lutar no interior do PT. Estamos convictos de que a militância do PT se encontra diante de duas possibilidades: ou acaba com o PED ou o PED acabará com o PT que, ao menos etimologicamente, significa partido da classe trabalhadora, democrático, de massas e instrumento rumo ao socialismo democrático.

*Bruno Costa, secretário de juventude do PT/RN, militante da Articulação de Esquerda, tendência interna do Partido dos Trabalhadores.
**Daniel Valença, professor da Universidade Federal Rural do Semiárido – UFERSA, militante da Articulação de Esquerda, tendência interna do Partido dos Trabalhadores.

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